quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Diário de uma Pedra Lapidada: Como me tornei mãe da minha mãe III

Enquanto eu ficava orfã de mãe viva o meu pai se encarregava de tomar as providências devidas para que pudessemos ficar um pouco mais estruturados. Nesta época apesar de trabalhar muito ,pelo menos os três turnos dando aulas, ainda morávamos em uma casinha de pau-a-pique, com 02 quartos,02 salas, cozinha e banheiro, uma das últimas que existiam na cidade pois esse tipo de casa foi sendo aos poucos abolida da capital. A nossa casa era uma raridade e morar numa "casinha de chocolate" como costumava falar não era nada legal. Não éramos miseráveis mas essa era a imagem que a nossa casa passava para quem a olhasse. Por muitas vezes éramos dignos de dó pois quando chovia forte, o que não é comum no nordeste, sempre caia alguma das paredes e o meu pai se prontificava em colocá-la de pé novamente . Eu e meus irmãos estudávamos em escola particular mas viviamos em uma casinha de barro, comiamos bem, tinhamos brinquedos porém...
Era  engraçado ver uma secretaria do lar, doméstica, trabalhar em uma casinha de barro, e nós tivemos pelo menos 03 antes que a minha casa fosse construída, meu pai não podia nos deixar sozinhos e  minha mãe após adoecer continuou morando conosco embora ficasse períodos internada ou em viagens para casa de familiares, as suas maiores crises foram com sintomas de viagens repentinas,  o meu pai tinha que arcar com as despesas das várias viagens que a minha mãe inventava. Passamos um período assim porém devido a doença que só piorava a minha mãe já não aceitava mais o convívio de pessoas estranhas a família e tivemos que despedir a empregada, foi exatamente este o momento que passei a ser mãe da minha mãe. Como não tinha mais ninguém em casa para nos ajudar o meu pai me deu tarefas diárias de vigilância e também de muita responsabilidade. Eu tinha que olhar torneiras para que não ficassem abertas, tinha que olhar o gás para que não houvesse explosão na casa, tinha que desligar as luzes, tinha que fechar as portas pois a minha  mãe deixava tudo aberto, tinha que obedecer a minha mãe mesmo doente e tinha que me sacrificar para ser uma boa filha. Nesta época já estava com  08 anos e passei a deixar de fazer as refeições principais de uma forma correta, tomava café da manhã no café ,café da manhã no almoço e café da manhã no jantar pois a minha mãe só fazia isso para comermos. Nos obrigava a tomar café com leite com bolo, nescau com biscoito, nescau com cuzcuz, café com leite com tapioca etc...  Eu tomei tanto café com leite que não aguentava mais, até  abusei...
Como ainda não sabia cozinhar fiquei adepta do miojo com calabreza, o meu pai trazia várias unidades deste alimento não tão saudável e eu fazia isso para comer antes de ir para a escola, para mim estava ótimo, até aprender cozinhar foi isso que eu comi.Quando estávamos com muita fome passávamos na casa da minha avó ( a mãezinha, chamada assim carinhosamente por todos os netos e depois também pelas minhas amigas) para almoçarmos.
Minha mãe só piorava, passou a andar com panela na cabeça e ia nos buscar na escolinha com essa panela na cabeça, as outras crianças me apelidaram de menino-maluquinho e quase todos os dias minha mãe enviava bolo queimado na lancheira e suco arripunando( muito doce, com muito açuçar). Eu abria a lancheira e jogava o lanchinho no lixo, abri uma continha na cantina da escola.Colégio Cecília Meireles, lembro até hoje da minha escolinha, como os diretores e os professores nos ajudavam... Quantas vezes a diretora(o) desta escola levou o meu irmão Leonardo em casa pois esquecíamos de buscá-lo, eu ás vezes esquecia de buscar o meu irmão, o coitadinho ficava pelo menos umas 02 horas após o término da aula esperando ou esperava  até fechar a escola, quando os diretores o levavam para casa. Criança cuidando de criança já viu né ? Até eu assimilar as atividades que estavam sob minha responsabilidade demorou um tempinho...



Nenhum comentário:

Postar um comentário